domingo, 14 de setembro de 2014

O LETRAMENTO DIGITAL E AS PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA

Bruna Maele Girão Nobre Pinheiro

O trabalho do professor propicia o contato com as mais diferentes gerações, o que faz com que ele desenvolva a necessidade de se atualizar e conhecer os novos recursos pedagógicos disponíveis a fim de saber adaptá-los ao seu público, de acordo com o nível de contato que este tem com as ferramentas tecnológicas que lhe são apresentadas, bem como sua proficiência ao utilizá-las.
Essa adaptação se faz necessária porque o processo de ensino-aprendizagem acontece através da relação professor-aluno e também da relação aluno-aluno. Cada vez mais, vem se fazendo necessária a interação entre os atores desse processo, uma vez que a sala de aula já deixou de ser o espaço do medo e passou a ser o espaço das dúvidas, o que é positivo, pois é a existência das dúvidas que favorece a mediação do conhecimento com o objetivo de sistematizá-lo.
Assim, é preciso refletir se ter acesso às novas tecnologias significa dominá-las e usufruir de suas funcionalidades de forma crítica a fim de participar efetivamente da construção do conhecimento. No âmbito educacional, são comuns os relatos de equívocos causados pelo uso inadequado dos novos recursos tecnológicos e, por falta de conhecimento, muitos professores continuam recorrendo a práticas pedagógicas menos interativas e mais mecanicistas.
As possibilidades de interação que as novas tecnologias têm propiciado são inúmeras e os atores do processo ensino-aprendizagem nem sempre estão seguros de seu papel, uma vez que ainda são necessários diversos esclarecimentos acerca das reais possibilidades das ferramentas tecnológicas que estão disponíveis para a prática pedagógica. Um aspecto fundamental a ser considerado para o uso eficiente das TICs em sala de aula é o Letramento digital, que, segundo Xavier (2005), “se realiza pelo uso intenso das novas tecnologias de informação e comunicação e pela aquisição e domínio dos vários gêneros digitais”.
Não é possível, portanto, dissociar o letramento digital das práticas de leitura e escrita no cotidiano de alunos e professores. Há quem diga que nunca se leu e escreveu tanto na história. O letramento digital implica um saber que vai além de uma alfabetização eficiente. Ele envolve mudanças importantes nos modos de ler e de escrever, uma vez que, de forma digital, o que se apresenta diante do indivíduo é um mundo de informações ao qual ele pode ter acesso ilimitado, já que um texto leva a outro.
No ensino de Língua Portuguesa, o trabalho com textos se enriquece diante dessa diversidade. O aluno lê de forma mais frequente, embora nem sempre de forma crítica. Cabe, então, ao seu professor, mediar esse contato com os textos, favorecendo assim, uma prática de leitura que visa à construção do senso crítico. São ferramentas bastante úteis para se chegar a esse objetivo os chats e os fóruns de discussão, pois ao mesmo tempo em que facilitam a interação aluno-aluno, possibilitam a mediação do professor, que instigará sua turma com novos questionamentos, que poderão guiar os alunos para novos textos e em seguida para novas discussões.
Sabe-se que, no contexto de muitos alunos, o uso do computador, bem como as práticas de leitura e de escrita através desse instrumento, ocorre de modo natural. A criança ou adolescente apropria-se de seus textos, tornando-se sujeito de sua produção, podendo ainda contribuir na produção de seus pares. Ao professor, cabe dar a devida importância a esses textos, orientando os alunos em projetos de produção textual, como a criação de blogs ou de verbetes em sites como a Wikipedia. Isso possibilitará tornar público o texto produzido pelo aluno, que terá uma maior atenção com aspectos como organização de ideias e ortografia.
Verifica-se, assim, que o trabalho com o computador pode ser rico e proveitoso se houver um planejamento satisfatório e um conhecimento por parte dos professores. É impossível fazer um planejamento eficaz se não houver conhecimento, portanto, é imprescindível que haja estratégias internas (na escola) e externas (na rede de ensino) de capacitação dos docentes, a fim de habilitá-los para essa utilização.
Não se pretende, obviamente, com este ensaio, apontar respostas acerca do ensino de Língua Portuguesa e de incentivo à leitura e a escrita, mas coube a este texto demonstrar estratégias que podem ser exitosas nessa empreitada. O trabalho do professor é árduo e envolve muitas especificidades que devem ser consideradas, mas é preciso reconhecer que as tecnologias são uma realidade que veio fortalecer a relação entre os sujeitos da aprendizagem e propiciar cada vez mais a interação entre esses sujeitos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SCHONS, Mariane Maria e VALENTINI, Carla Beatris. Movimentos de letramento digital nas práticas de leitura e escrita: um estudo de caso de uma criança do ensino fundamental. 2012.
XAVIER, A. C. S. Letramento digital e ensino. In: SANTOS, C. F.; MENDONÇA, M.(Orgs.). Alfabetização e letramento: conceitos e relações. Belo Horizonte: Autêntica, 2005, p. 133-148.



sábado, 14 de maio de 2011

Bodas

Era o aniversário de casamento deles. Cinco anos. Já era noite e a menina dormiria na casa da avó para que os pais pudessem desfrutar de um momento a dois, já tão raro.

Estava ela ainda às voltas com o artigo para o jornal do dia seguinte, comentando os últimos escândalos do governo. Era importante, valia sua promoção. Era só finalizar e enviar por email.

-Rapidinho, meu bem!

-Deixe que eu preparo o jantar hoje. Estou cheio de ideias pra esta noite.

-Amo você!

E ela continuou a escrever, rápida em seu computador, dava a entender ao marido que aquele trabalho realmente seria concluído em instantes. Foi quando começou a crise de criatividade. Ela pensava nos fatos, revia as notícias e simplesmente não conseguia formar uma opinião que valesse um artigo.

Ele, chef de cozinha de um restaurante italiano, sempre cheio de ideias, preparava na cozinha mais um de seus molhos especiais, receita exclusiva. Já tinha um cardápio exclusivo montado, mas o patrão não aprovara por medo de perder a clientela. Manteve-se o cardápio antigo. Mas a inspiração nunca faltava, e naquele dia, especialmente inspirado, embevecido de amor à mulher que escolhera para toda a vida e cheio de expectativa para aquela noite, criava uma nova receita.

Depois de muito pensar, finalmente um raciocínio lógico, uma ideia que apareceu como um flash lhe trazia de volta a lei que havia sido descumprida. Tecia todo um comentário baseado em leis e em propostas de governos não atendidas. Aquele era realmente um escândalo digno de notícias e artigos.

Finalmente. O melhor artigo de sua vida estava pronto...

E uma queda de energia acabou com todo o trabalho. Não conseguiu outra coisa senão rir, rir muito e chorar, como nunca antes havia chorado. Era o trabalho que lhe valia o reconhecimento pelo qual lutava havia anos!

O marido, vendo seu desespero, tentou consolá-la, mas o que ele entendia de artigos? Era um cozinheirozinho que se metia a chef. Ele que não se intrometesse. Onde já se viu dizer que tudo ficaria bem?

Entraram com o pedido de divórcio naquela semana.

Um ano depois, a imagem do sucesso: Tudo realmente ficou bem.

Ela fora promovida mesmo sem o artigo. Era uma excelente profissional e merecia a promoção. Ganhara o cargo de editora-chefe. Tremenda responsabilidade.

Ele também progrediu. Saiu do restaurante italiano que tinha medo de perder os clientes e abriu o seu, com suas ideias e seu cardápio exclusivo. Um restaurante experimental. Tremenda responsabilidade.

Quanto à menina? Ainda está com a avó. Até hoje.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Poesia

Tem que ser meio poeta para olhar a vida e não se desesperar com ela, ou se desesperar talvez, e chorar num lamento ou rir num frenesi, mas sim, tem que ser meio poeta para enxergar nas pessoas qualquer traço do sublime, do belo, para perceber na multidão uma porção de nuances, de histórias as mais fascinantes, para notar num relance que uma criança está sorrindo (e elas sempre estão sorrindo).

Tem que ser meio poeta para olhar no olho, dar um abraço, apertar a mão. O toque é a demonstração de que um corpo precisa do outro. Tem que ser meio poeta para sentir isso, para precisar disso. Sim, tem que ser meio poeta para amar as pessoas. Não o amor egoísta do "eu te amo", mas o amor mais bonito que diz: "estou aqui" e: "quer ajuda?". Tem que ser meio poeta porque tudo é tão mais simples, tudo uma hora se resolve. Há que se acreditar nisso para viver.

Tem que ser meio poeta para lamentar as desgraças do mundo, para se alegrar nas conquistas dos outros. Tem que ser meio poeta para acreditar que há mais, muito mais, e que aquilo que se vê é distorcido. Tem que ser meio poeta para entender que sempre existe um lado bom, e que nem tudo acaba quando acaba: sempre tem alguma coisa começando.

Bruna Girão

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

eu sou como a dona aranha
subi, subi, subi,
mas aí veio a chuva forte
e me derrubou.

A chuva passou
e o sol já surgiu
mas agora eu tô com medo de subir.

Bruna Girão

quinta-feira, 17 de junho de 2010

FELICIDADE

Ela bem queria um dia, uma única vez lembrar aquilo que a fazia infeliz... Mas ela não podia... Tão irremediavelmente anestesiada que era feliz o tempo todo.


Será que havia motivos para fazê-la chorar? Provavelmente não:

Na infância:

“Que picolé gostoso”

–Me dá esse picolé. – dizia o amiguinho que sempre queria as coisas dos outros.

“Toma” (e ela já se distraía com uma formiga que ia passando)

Na adolescência:

Pessoas rindo, conversando, estudando...

“Posso me sentar aqui?”

–Não. Este lugar está ocupado. Sai daqui.

...

“Escrevi esta carta para você”

(tempo de leitura) (risada sarcástica)

–Meu amor... Vê se te enxerga!

Ela não teve muitos problemas com amigos ou namorados...

Na idade adulta:

“Aqui está o meu currículo”

–Sinto muito, você não se encaixa no perfil (A loja de roupas)

...

“Oi, vim deixar o meu currículo”

– Desculpe, mas a vaga já foi preenchida. (Recepção de consultório médico)

...

“Vocês estão recebendo currículos?”

–Não. (Outro estabelecimento qualquer)

Ela também não teve problemas no trabalho.

E viveu assim, sem problemas, todos os dias de sua vida. Ela era realmente uma mulher feliz.

Bruna Girão

segunda-feira, 14 de junho de 2010

[...]
Tenho a impressão
que já disse tudo.
E tudo foi tão de repente.

Paulo Leminski

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Ne me quitte pas

Eu estava com raiva. Dele. Com ódio, mas não podia matá-lo. Nem me matar por sentir o que eu sentia, então resolvi sair, resolvi fugir, ir para bem longe, num lugar onde ninguém pudesse me encontrar...

Salto alto, preto, lindo... Ele teria achado sexy, mas não, não era pra ele... Estava escuro, não dava pra ver meus olhos vermelhos. Ah... eles são todos idiotas... O jeito de olhar era patético... Ao menos não se parecia com ele, embora tivesse o que eu queria... Ah, e como tinha... Mas quis saber meu nome, então tive que fazê-lo desistir da ideia... Que pena... era até bonitinho...

Espartilho e salto alto, preto, olhos vermelhos. Irresistível. Escuro. Olhares de cobiça – meus. Gravata e perfume de grife – adoro... Delícia... Mas quis saber de onde venho... estava tão quente e de repente ficou frio, gelado. Voei pra longe... Ah, como eu gosto disso!

Mas e ele? Sem mim deve estar quase morrendo... Só eu sei dar o que ele quer!

Escuro, sempre e ainda quero. Ainda estava quente, bem quente... Pra quê tanto desejo? Estava quente, bem quente, tanto que percebi mãos frias, firmes. Fingi gostar, mas o desejo – não o meu – era tanto que não resisti. “não dá pra contar quem sou, se contasse teria de matar você!” Se eu não quiser contar também... Mãos geladas... Prazer... Adoro isso!

Mas e ele? Logo vem me pedir perdão. Eu sei.

Seguidores